Não se pode tomar a orientação sexual do personagem como condição para que se escolha um livro. Não racionalmente falando, mas subjetivamente, a orientação sexual pesa, sim. Está provado que os semelhantes se atraem e, não os diferentes. Então, suponhamos que você, gay, vá lá e escolha um livro com temática gay. Você vai ter muitos bons autores à disposição, mas vai ter também autores que retratam gays como seres superiores, quase perfeitos. Se você conseguir fugir dos panfletários, poderá ler um bom livro, com personagens verossímeis e uma trama que efetivamente o transporte para dentro da história.
Para ser lido, contudo, o livro precisa ser divulgado. E literatura gay, como sabemos, é considerada um gênero menor. Nem os gays consomem literatura gay como se poderia esperar - o preconceito começa em casa, como se diz. Ora, para a literatura gay começar a ganhar mercado precisaria, antes de mais nada, ser consumida por gays. Tirando uma média entre as pesquisas, aqui no estado do Rio temos cerca de 15 por cento de gays. Se esta fatia da população consumisse literatura que a retratasse, tal literatura certamente se tornaria atraente para grandes editoras e haveria maior investimento e divulgação.
Mas para além de questões mercadológicas, falemos de autoestima e empatia. O fato é que ver-se na arte pode ser extremamente importante no processo de aceitação do gay, tanto para a aceitação no âmbito individual (autoaceitação), quanto para a aceitação do gay no âmbito social. O homossexual, ao ver-se retratado, tende a aceitar-se melhor. O heterossexual, ao se deparar com um personagem homossexual e identificar-se com ele de alguma forma, consegue enxergar que o “outro”, afinal, não é tão diferente dele quanto se poderia esperar. Ou seja, no fim, toda emoção é feita da mesma matéria-prima. Sejamos nós héteros, bi, homo, trans; o ser humano transcende os rótulos.
Em resumo, se você é gay não precisa ler um romance gay para se emocionar. Mas se você for hétero também deveria poder ler um romance gay e se emocionar. Deveria ser assim, mas a heteronormatividade, que rege a sociedade, acaba afetando todos nós. Entretanto, a arte vem rompendo essas barreiras e o audiovisual parece andar bem na frente. Romances gays no cinema atraem cada vez mais gente de qualquer orientação sexual. Romper essa barreira na literatura parece apenas uma questão de tempo.
*Luciana Guerra Malta é jornalista, escritora, autora de peça teatral e acaba de lançar seu primeiro romance "Concerto Ariano" pela Editora Metanoia.